quarta-feira, 9 de maio de 2012

de MERKOZY a MERKOLLANDE?



Apesar da vitória mais do que assegurada, os efeitos da mudança política na presidência francesa não foram mesmo assim atenuados.

Começo por falar da primeira volta das eleições presidenciais. A grande surpresa foi o resultado obtido pela líder de extrema-direita, Marine Le Pen: com 17.9% dos votos, o seu partido tornou-se a terceira força política, e no fundo, um dos grandes vencedores destas eleições.
Os 7 milhões de eleitores que escolheram Marine Le Pen, foram suficientes para a líder acreditar numa reformulação de toda a corrente política de extrema-direita na França, e num maior peso desta corrente partidária no contexto político francês.

E a verdade é que o conseguiu, logo depois da divulgação dos resultados da primeira volta.
Na disputa dos votos entre Sarkozy e Hollande, os votos de todos os outros candidatos estavam praticamente assegurados para um ou outro: todos, excepto os de Marine Le Pen. E com 7 milhões de votantes, e com uma diferença tão pequena entre Hollande e Sarkozy na primeira volta (de apenas 1.45%), o candidato que os conseguisse obter, teria o caminho para o Eliseu bem mais facilitado.

Quem parece ter levado este pormenor muito a sério foi Nicolas Sarkozy, que durante a campanha para a 2ª volta alterou a temática dos seus discursos centrando-se nos temas mais caros à Frente Nacional: o problema da imigração e da insegurança pública, e a oposição ao projecto europeu.

E as surpresas continuaram na segunda volta: venceu François Hollande (de acordo com as previsões), o que significou a primeira vez na História da V República Francesa, que o Presidente perde na corrida para o segundo mandato. E desde 1995 que a França não tinha um presidente socialista.

Deixando as questões de política interna para os Franceses, vou falar daquilo que toda a gente fala, e que realmente preocupa mais à Europa e ao mundo: a questão da crise europeia e da sua gestão.
A posição de Hollande foi sempre bem definida: aliviar a corrente de austeridade severa imposta pela Alemanha. Mas, certamente como forma de tentar agradar a todos, o discurso de Hollande foi sempre ambíguo nesta matéria:
- prometeu uma revisão do novo Tratado Orçamental, que impõe a obrigação de os governos, a médio/longo prazo conceberem orçamentos equilibrados. Mas também referiu que o aceitaria, como complemento à criação de um Pacto para o Crescimento;
- assegurou querer rever os estatutos do BCE, para que este se possa tornar um "emprestador" em último recurso para os Estados em dificuldade. No entanto, não referiu nada disso explicitamente no seu programa de governo;

Passo a analisar cada aspecto com mais detalhe:

Tratado Orçamental: mesmo recebendo Hollande de braços abertos, Merkel afirma que não vai abrir mão, nem vai renegociar o Tratado Orçamental. O que ainda está para ser definido é a data a partir da qual, todos os países da zona euro serão obrigados a ter orçamentos cumpridores da regra de ouro.

Pacto de Crescimento: A Alemanha está disposta a negociar o "pacto de crescimento" mas sem abrir mão da garantia de que todos os países mantém o compromisso de apresentar contas públicas controladas, aplicando as reformas estruturais necessárias para tal.

Empréstimo do BCE: Hollande deverá rebuscar a proposta de Sarkozy de alterar o mandato do BCE e possibilitar que este seja credor directo dos governos em dificuldade, como última instância.
Esta ideia concretizar-se-ia na transformação do FEEF, em bancos com a capacidade de se refinanciarem junto do BCE. Esta hipótese permitiria que os fundos de resgate do euro tivessem capacidade quase ilimitada, pois poderiam comprar dívida soberana nos mercados primário e secundário e obtendo liquidez junto do BCE, dando-a como colateral.

Eurobonds: Hollande é favorável à criação dos "project bonds" porpostos pela Comissão Europeia para financiar projectos de investimento concretos que suscitem o interesse comum e que favoreçam o crescimento.
A Comissão Europeia partilha desta visão: defende que a União deve emitir dívida europeia até um limite de 50 milhões de euros, juntamente com o reforço do capital do Banco Europeu de Investimento. Até agora tem prevalecido a posição da Alemanha que é contra esta medida...

Quanto aos mercados financeiros, apesar do impasse político criado pelas eleições na Grécia, reagiram razoavelmente bem à vitória de Hollande, o que trouxe um grande alívio sobretudo para Espanha e Itália.

Em relação ao futuro, só o tempo dirá o que vai acontecer. Mas o mais certo é que "Merkollande" não se desvie muito de Merkozy. Mesmo que Hollande tenha que actuar contra aquilo que disse durante a campanha, se não seguir a linha política da Alemanha, o mais provável é acabar na mesma condição que os países do Sul da Europa.

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