sábado, 3 de março de 2012

O Império das Agências de rating

Quem, há uns meros 20 (ou talvez menos) anos atrás poderia imaginar que seriam umas entidades estrangeiras, algumas com menos de um século de existência, que não possuem poder militar, nem económico mas que, através da mera especulação e das suas opiniões conseguem prejudicar tanto Estados (as entidades soberanas que supostamente deveriam ser igualmente as entidades mais credíveis do mundo) como fazer tremer o maior e mais robusto bloco económico do mundo, e no fundo, abalar toda a ideologia económica dominante no sistema-mundo actual.

Quem vai acompanhando as mensagens que eu vou postando aqui, certamente que se recorda do comentário que fiz sobre o corte no nível de rating feito pela Standard & Poor's a nove países da Área do Euro, e posteriormente a Egan Jones (que não aparece na imagem ao lado) ter descido a classificação da Alemanha.
Já naquela altura alertei para o abuso destas atitudes por parte das agências de rating, mas agora dedico a mensagem só a isso mesmo: ao pânico que continuam a lançar sobre os Estados e a economia internacional, e sobre a própria estrutura da União Europeia.

A descida do rating de vários países feita pela Standard & Poor's, provocou o espanto e o pânico não só dentro da União Europeia, como também um pouco por todo o mundo. De facto, este ataque para além de muito ousado (excessivamente ousado para alguns), que deixou no ar a possibilidade de mais penalizações no futuro que, agravam ainda mais a situação já de si precária de muitos dos países afectados pelos cortes, e provocaram uma divisão artifical dentro da própria União Europeia.

Estas acções das agências de rating reacenderam os velhos atritos entre os países do Norte da Europa, que se auto-proclamam detentores de uma economia saudável e robusta e que sustentam os países da Europa do Sul, que persistem em viver mergulhados nos seus problemas económicos, provocados por más governações.

No entanto, o mais revoltante no meio disto tudo, é o facto da Standard & Poor's, bem como as outras agências de rating, continuarem a intrometer-se onde não são chamadas e continuarem a apoiarem as suas decisões em razões que parecem cada vez mais rebuscadas. Apesar das medidas de austeridade que os países mais afectados pela crise continuam a implementar e dos resultados que começam a obter (sem contar obviamente com o caso especial da Grécia), que poderiam ser melhores se não continuassem quase todos presos num ciclo de constante recessão económica, do aumento dos fundos de resgate europeus e dos sinais de compreensão que são emitidos pela Alemanha e pelas instituições europeias, sobre os esforços dos países em dificuldades, as agências de rating continuam a tratar os países Ocidentais como se fossem países subdesenvolvidos.
E parece que os mercados continuam a dar demasiada importância à opinião das agências de rating. E pior do que isso, parece que estas opiniões (porque de facto não passam de isso, de opiniões que não têm nenhum carácter decisivo nem soberano sobre o assunto), está a influenciar a política e o próprio funcionamento da União Europeia. Sim porque as agências de rating (estas 3 são americanas), continuam a avaliar a Europa como se tivessem a avaliar os EUA e como se toda a economia mundial se tivesse comportar como a economia norte-americana: por isso é que, enquanto a Europa não se comportar como se comportam os EUA nesta situação, as agências de rating continuarão a castigar as classificações dos países europeus.

No entanto, um aspecto que está a agradar às agências de rating é o comportamento do Banco Central Europeu (BCE) que, está a seguir uma estratégia semelhante ao modelo norte-americano para evitar o afundamento dos países em dificuldades: o BCE está a comprar dívida aos países em maior dificuldade em enorme quantidade, permitindo-lhes também pedir  elevados empréstimos a taxas de juro incrivelmente baixas. A manutenção da taxa de juro a 1% permite às empresas financiarem-se a baixo custo, relançarem a sua produção e assim criarem mais postos de trabalho.
Apenas isto parece estar a agradar às agências de rating. Mas não é o suficiente: para elas o modelo europeu deve aproximar-se cada vez mais do modelo norte-americano. Para isso a Europa devia procurar emitir moeda descontroladamente, desde que as condições o exigissem, para auxiliarem o sistema bancário, e aplicar políticas de relançamento orçamental, em vez de apoiar tanto a poupança dos agentes.
Infelizmente, parece que ainda não perceberam que a Europa é diferente dos EUA, e neste momento os EUA não são modelo nem exemplo para ninguém. O país também está completamente estrangulado por uma dívida pública de proporções gigantescas: e eles não têm um sistema social como o dos países da Zona Euro... o que ainda torna o seu endividamento mais estranho...

Neste momento as agências de rating têm desempenhado um papel para o qual não foram criadas, estão a receber demasiada importância para quem apenas tem por função emitir opiniões baseadas em critérios por eles próprios escolhidos, e estão a meter-se onde não são chamadas, esquecendo-se completamente do seu verdadeiro papel...


É preciso ser-se lixo para 
se reconhecer outro lixo!!!
A prova disto é aquilo que eu já referi: as agências de rating norte-americanas, apenas com base nas suas classificações conseguiram dividir a União Europeia.
A Alemanha resiste como o único bom aluno (e tudo o que lhe acontece de mau é da responsabilidade dos outros membros que ela tem que trazer consigo por arrasto). A norte encontram-se os países mais "ajuizados" e que parecem resistir a tudo isto, visto terem sempre aplicado políticas adequadas e terem um total controlo e equilíbrio das suas contas públicos. Ao sul, encontram-se os países irresponsáveis vistos aos olhos dos vizinhos do Norte como preguiçosos e sem capacidade para fazerem nada correcto. E a Grécia está como um caso especial deste grupo, pois é vista como um dos factores que conduziram ao afundamento dos outros países do Sul.
No meio disto tudo, a França por mais que se queira colar à Alemanha, não deixa de estar numa situação intermédia entre a situação da Alemanha e dos países da Europa do Sul, estando infelizmente a aproximar-se dos segundos.

Neste momento estão a surgir dentro da Área Euro, dois "Euros": um para o Norte e outro para o Sul.

Quanto aos Governos Europeus, estes têm duas maneiras de reagir à actual situação: ou continuam a dar excessiva importância às agências de rating e continuam a basear-se apenas na frieza dos números para todas as suas políticas, ou decidem de uma vez deixar de estarem presas ao passado e reformam um sistema de avaliação completamente ultrapassado. Sim, porque este controlo por parte destas 3 agências de rating está completamente ultrapassado. Não basta emitir uma opinião e apresentar uma duas ou três (e às vezes nem são tantas) justificações para o ar. Deviam ser obrigadas a prestar contas das suas decisões e fundamentá-las convenientemente. Para não falar na necessidade de rever a escala de notação.
Se nada for feito, este "joguinho" estará para ficar e vai continuar a arrastar os os países, um a um sem esquecer ninguém. Talvez quando todos os países entrarem em bancarrota se deixe de acreditar nestas agências e se comece finalmente a pensar em alternativas.

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