sábado, 21 de abril de 2012

MADE IN CHINA (I)

Porque a China é o que está a dar, começo aqui uma série de mensagens em que vou falar sobre o que se está a passar na China (ou pelo menos aquilo que deixa transparecer para o exterior) e aquilo que a China está a fazer pelo mundo.
Vou começar aqui uma série de mensagens (ainda não sei bem quantas serão, depende do que for surgindo e que eu ache importante colocar aqui), sobre a realidade chinesa. Inicialmente vou-me concentrar só no país, e depois na sua relação com o resto do mundo.




A China é um país muito heterogéneo em todos os aspectos. É o terceiro em termos de extensão, e o mais populoso. No entanto, 96% da população encontra-se no Sudeste do país que só representa 36% do território. Em 2010 a população total era de 1.341 biliões de indivíduos (nem vale a pena tentar contar os "Portugais" que cabem aqui), mais 7 milhões do que em 2009 (e convém não esquecer que ainda está - e estará - em vigor a política do filho único, que só muito recentemente foi retirada - ainda com certos limites - em algumas zonas específicas, mas muito pequenas, do território). A política do filho também alterou profundamente a estrutura etária da população chinesa: em 2010 mais de 70% da população encontrava-se na faixa etária dos 15-64 anos e, apesar da população com mais de 65 anos aparecer só em 3º lugar, esta já representa 8% do total da população.

Do ponto de vista económico, do total da população 819.5 milhões estavam empregados em 2010, e só nesse ano foram criados mais 11.6 milhões de novos postos de trabalho do que em 2009.
22.3 milhões são estudantes, e em 2010 saíram das universidades chinesas 5.7 milhões de licenciados. Apesar de ser ainda uma percentagem ínfima da população portuguesa, a China tem sabido aproveitar todo este capital humano que possui, através da criação de inúmeros centros de investigação (1200 em 2010), e o registo de quase 400 mil patentes.

Continuando a analisar a demografia da China, podemos constatar que 47% da população já vive em meios urbanos, um número que em breve vai aumentar muito, pois o Governo Chinês prevê a criação de cidades de tamanho médio inicialmente apenas no centro do país, de forma a combater esta excessiva concentração na zona costeira, e reduzir as desigualdades económicas e sociais entre o litoral e o centro e interior do país.

A nível climatérico, sendo um país tão extenso, na China podem-se encontrar vários tipos de clima. Esta heterogeneidade também se verificada a nível de dialectos: de facto o chinês enquanto língua não existe, porque é uma mistura de muitos dialectos que ainda  têm diferenças substanciais entre si.
A nível administrativo, o país é composto por 22 províncias, 4 Municípios, 5 regiões autónomas e 2 regiões administrativas especiais (Macau e Hong-Kong).

Todas as regiões chinesas podem ser comparadas a nível de PIB per capita em paridade do poder de compra, a um país. Por exemplo, tanto a província de Shandong como Jinagsu têm o mesmo PIB per capita em PPP da Suíça, a província de Zhejian o mesmo que a Áustria e a pequena região de Macau, o mesmo que o Panamá.

Todos estes indicadores indicam que existem muitas diferenças a nível económico e até certo ponto político, entre as várias regiões, o que não torna fácil o contacto dos empresários ocidentais com o mercado chinês.
A competição entre regiões e o proteccionismo, dificultam ainda mais esse contacto, e constituem um encargo adicional para o Partido Comunista que tem que assegurar que são cumpridas cláusulas da Organização Mundial de Comércio.

Apesar de uma boa fatia da população ainda não ter acesso aos mais modernos aparelhos tecnológicos, sendo o país mais populoso do mundo, é suficiente para que a China seja o país com a maior rede tecnológica do mundo, e nível de meios e vias de comunicação para lá caminha.

Mas recuemos um pouco para o passado. Não é só desde os finais do século XX que se houve falar da China como centro geo-estratégio importante no quadro internacional. Desde a antiguidade, que a China sempre foi uma civilização muito evoluída e, muitas das invenções e descobertas quando chegaram ao Ocidente, já tinham séculos de existência na China. Infelizmente quando os Ocidentais chegaram à China na altura dos descobrimentos, a sua visão de superioridade face ao resto do mundo, fê-los ver a civilização chinesa (como muitas outras), não como mais próspera do que a Europeia, mas sim como exótica e excêntrica.
A verdade é que, a China sempre se apresentou por um país muito fechado ao exterior. Mesmo a chegada dos ocidentais, não alterou nada a situação, acabando por ser mal recebidos e expulsos do país.
A título de curiosidade, os Missionários que naquela altura iam para a região asiática, acabaram por entrar e viver na China como clandestinos.
Portugal conseguiu ver uma vantagem e estabelecer uma relação mais favorável com a China. Estando de relações cortadas com o Japão, Portugal serviu durante muitos anos de intermediário comercial entre a China e o Japão comercializando os produtos que cada um necessitava.

No entanto, fora este e outros casos esporádicos, a China continuou até meados do século XX como um país muito fechado, recusando todas as investidas do Ocidente, e até dos vizinhos asiáticos.
Até que, nas últimas décadas do século XX, fruto de vários factores (políticos e económicos) a China começou a abrir-se ao exterior, culminando com a adesão à Organização Mundial do Comércio (OMC) em 2001, o que significou uma ruptura total com a política seguida até então pela China.
A adesão da China à OMC foi talvez a que mais impacto criou no sistema comercial do mundo. É verdade é que nunca foi tão fácil para os empresários estrangeiros estabelecerem relações comerciais e fixarem as suas unidades de produção na China (apesar de ainda se manterem sobretudo na zona costeira).
E para a maioria das empresas que fixaram algumas das suas unidades de produção na China, foi apenas este país que conseguiu atenuar os efeitos da recessão sobre elas, pois é o país de onde conseguem obter mais lucros.

Mas engane-se quem pensa que a China deu uma volta de 180º face à política anterior e agora está completamente aberta, e que as empresas podem "invadir" o país a seu belo-prazer.
Toda esta mudança na relação com o exterior foi fruto de uma estratégia política cuidadosamente pensada. Além disso, o Partido Comunista Chinês continua a ter um papel fortemente interventivo em toda a actividade económica.
Não é pelo facto de se ter aberto ao exterior que o regime político se tornou mais democrático. Aliás, o regime chinês não cabe nas nossas concepções (ocidentais) nem de Democracia nem de Ditadura. E está longe do comunismo soviético, e também se começa a afastar um pouco do comunismo popular do tempo de Mao Tsé Tung.

O Dragão anda a mudar os seus hábitos!!!
Apesar de toda a abertura, o Governo chinês continua a seguir em muitos aspectos a linha dura dos seus antecessores. Os burocratas do Governo têm a seu cargo a elaboração e a aplicação das leis, que são criadas em nome da ordem social, política e económica. Sendo um regime de partido único, tudo o que emana do Partido Comunista tem um forte impacto em toda a vida do país.

Até finais dos anos 70 do século XX, a visão predominante era da "Sociedade Igualitária":
- Todas as actividades económicas eram nacionalizadas: a economia era planificada e de       Direcção Central;
- O Governo exerce um forte controlo sobre a vida social e política do país;
- De acordo com o ideal comunista não existem classes sociais: todos iguais perante a pobreza: a ideia do "Socialismo de Pobreza";
- Existência apenas de uma classe social especial: os burocratas e funcionários do partido;

Posteriormente, e até início dos anos 90 esteve em vigor a visão da "Sociedade Confortável":
- A pobreza deixa de ser vista como algo indissociável do socialismo;
- O Governo definiu que algumas regiões e grupos de pessoas deviam enriquecer primeiro, para depois enriquecerem os outros;
- É neste período que se dá a queda dos países Comunistas da Europa de Leste, o que obviamente leva o Governo Chinês a redefinir algumas das suas estratégias políticas;
- Inicia-se a reforma do sistema económico com vista à transição para uma economia de mercado: há uma descentralização da propriedade económica com a atribuição de incentivos locais e sociais;
- Apesar de o Partido Comunista continuar a exercer um elevado controlo sobre os vários aspectos da vida dos chineses, estes começam a ter muito mais liberdade;

É nesta altura que se inicia a política de "Porta Aberta" convidando à entrada do capital estrangeiro.
As empresas estrangeiras começam por apostar na indústria transformadora virada para as exportações e na produção de bens intensivos em mão-de-obra.
Para atrair esse investimento, o Governo lança-se na construção de inúmeras infra-estruturas de suporte para as futuras empresas.
As próprias empresas domésticas são convidadas a aumentar o seu investimento na produção de bens intensivos em mão-de-obra para exportação.

Durante os anos 90 e até 2004, esteve em vigor a visão da "Sociedade Confortável em todas as Dimensões":
- O capitalismo é agora visto como um caminho a seguir para se atingir o desenvolvimento: logo a economia de mercado torna-se o fio condutor da política económica chinesa;
- A assembleia do Partido Comunista Chinês deixa de ser composta apenas por membros do partido: são convidadas pessoas não afiliadas ao partido;
- As leis passam a proteger os direitos de propriedade privada;
- O Conselho do Partido Comunista Chinês é visto como representante:
   . das forças produtivas mais avançadas;
   . da cultura mais avançada;
   . dos interesses fundamentais do povo;

Desde 2004 está em vigor a visão da "Sociedade Harmoniosa":
- A visão de que se devia deixar enriquecer primeiro certas zonas do país e certos grupos de indivíduos, mostrou não ser viável: antes pelo contrário levou a grandes disparidades económicas regionais;
- Face a estas desigualdades aumentou a contestação: o que pode ameaçar a estabilidade económica;
- A política de ter o crescimento económico como única preocupação para além de ter sido insustentável, levou a problemas ambientais e energéticos;
- A grande urbanização apenas centrada na zona costeira, levou a um grande êxodo das zonas rurais e a um acentuar das assimetrias;

Face a isto, o Governo alterou as suas estratégias:
- em vez da ênfase no crescimento do PIB passa a ser dada mais importância ao crescimento do PIB per capita e ao crescimento harmonioso de todo o país;
- aposta no desenvolvimento do centro e do interior do país;
- criação de uma sociedade do conhecimento com aposta na inovação tecnológica e na qualificação dos recursos humanos;


E por agora fico por aqui. Na próxima mensagem vou começar por acabar (ficou estranho!!!!) de explicar a actual estratégia política e económica da China e depois passar para todo o poder que está a assumir no contexto económico mundial.

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